Carta virtual endereçada à Dora
Querida Dora,
descobri a pouco tempo que seu nome significa presente em grego. Como a língua portuguesa é uma beleza (mesmo com a rima persistindo), então o "em" faz muita diferença do "de". Havia escolhido com sua mãe esse nome antes, mas o motivo foi musical mesmo. Acabamos ganhando esse presente maravilhoso, através de sua chegada, devagarinho, que é preciso redescobrir a importância da delicadeza em nossas vidas.
Fiquei muito feliz de lhe ver - no ultrasom - lambendo seu joelho. Ele deve ser saboroso, penso. Sempre é gostoso descobrir as coisas da vida. Descobrir-se então, não tem nem medida.
Já havia eu plantado umas árvores por aí, e venho escrevendo alguns livros. Espero que você possa ler eles às protetoras sombras das mesmas.
Eu prometo que irei lhe levar, junto com sua mãe, para conhecer o mundo. Não falo do Cristo Redentor, nem da Torre Eiffel. Falo desse mundo enorme, que está no nosso quintal. Que passa diariamente na frente de nossos olhos, desatentos, sempre tentando enxergar o que não se pode ver.
Dora, minha filha, sei que os tempos são outros. Sei que eu e sua mãe fizemos parte de outra geração, que brincava de queimado, barra-bandeira, pipa, peão, bolinha-de-gude, carrinho de rolimã, bonecas moranguinho, pega-pega, bicicleta, esconde-esconde, casinha de boneca, pique-nique. Viviamos o dia inteirinho no meio da rua, e não eramos chamados de "meninos de rua".
Tinhamos vinis coloridos (o que é vinil? Vinil, minha filha era um disquinho que tocava música ou estorinha. É o avô do mp3). Tomavamos guaraná fratelli e comíamos goiabada com bolacha pilar, sorvete kibon, pão francês com mortadela e não existia problema de obesidade ou taxas glicêmicas alteradas.
Vejo as crianças dessa sua época - a da velocidade da luz - e fico peocupado. Os computadores, a internet, os jogos eletrônicos, as tvs e dvds, são ferramentas importantes, mas acabam involuntariamente mantendo vocês presos, dentro de casa.
Sabemos das dificuldades que existem para exercitamos nosso direito de ir e vir. Nossa liberdade. Defenderei o seu direito, assim com sempre fiz com todos que amo. Levarei você para passear nos (poucos) parques que nossa cidade tem.
Farei com que cada pedaço do Recife seja uma descoberta deliciosa para seus pequenos, porém gulosos olhos. A gula nem sempre é um pecado, quando se quer apreender a vida.
O que é pecado? É uma invenção das pessoas grandes para poder fazer escondido as coisas que mais gostam.
Por fim, Dora, espero que você possa conhecer as pequenas belezas da vida, essas que não canso de dizer, são as mais importantes, as mais urgentes, as que nos fazem sermos humanos. Desejo que sempre um sorriso lhe comova, que todo abraço lhe proteja, e que as descobertas sejam para você pequenos presentes que a vida venha lhe entregar, diariamente.
descobri a pouco tempo que seu nome significa presente em grego. Como a língua portuguesa é uma beleza (mesmo com a rima persistindo), então o "em" faz muita diferença do "de". Havia escolhido com sua mãe esse nome antes, mas o motivo foi musical mesmo. Acabamos ganhando esse presente maravilhoso, através de sua chegada, devagarinho, que é preciso redescobrir a importância da delicadeza em nossas vidas.
Fiquei muito feliz de lhe ver - no ultrasom - lambendo seu joelho. Ele deve ser saboroso, penso. Sempre é gostoso descobrir as coisas da vida. Descobrir-se então, não tem nem medida.
Já havia eu plantado umas árvores por aí, e venho escrevendo alguns livros. Espero que você possa ler eles às protetoras sombras das mesmas.
Eu prometo que irei lhe levar, junto com sua mãe, para conhecer o mundo. Não falo do Cristo Redentor, nem da Torre Eiffel. Falo desse mundo enorme, que está no nosso quintal. Que passa diariamente na frente de nossos olhos, desatentos, sempre tentando enxergar o que não se pode ver.
Dora, minha filha, sei que os tempos são outros. Sei que eu e sua mãe fizemos parte de outra geração, que brincava de queimado, barra-bandeira, pipa, peão, bolinha-de-gude, carrinho de rolimã, bonecas moranguinho, pega-pega, bicicleta, esconde-esconde, casinha de boneca, pique-nique. Viviamos o dia inteirinho no meio da rua, e não eramos chamados de "meninos de rua".
Tinhamos vinis coloridos (o que é vinil? Vinil, minha filha era um disquinho que tocava música ou estorinha. É o avô do mp3). Tomavamos guaraná fratelli e comíamos goiabada com bolacha pilar, sorvete kibon, pão francês com mortadela e não existia problema de obesidade ou taxas glicêmicas alteradas.
Vejo as crianças dessa sua época - a da velocidade da luz - e fico peocupado. Os computadores, a internet, os jogos eletrônicos, as tvs e dvds, são ferramentas importantes, mas acabam involuntariamente mantendo vocês presos, dentro de casa.
Sabemos das dificuldades que existem para exercitamos nosso direito de ir e vir. Nossa liberdade. Defenderei o seu direito, assim com sempre fiz com todos que amo. Levarei você para passear nos (poucos) parques que nossa cidade tem.
Farei com que cada pedaço do Recife seja uma descoberta deliciosa para seus pequenos, porém gulosos olhos. A gula nem sempre é um pecado, quando se quer apreender a vida.
O que é pecado? É uma invenção das pessoas grandes para poder fazer escondido as coisas que mais gostam.
Por fim, Dora, espero que você possa conhecer as pequenas belezas da vida, essas que não canso de dizer, são as mais importantes, as mais urgentes, as que nos fazem sermos humanos. Desejo que sempre um sorriso lhe comova, que todo abraço lhe proteja, e que as descobertas sejam para você pequenos presentes que a vida venha lhe entregar, diariamente.